Por: Luiz Fernando Ramos Aguiar

Todo ano, nessa época, gosto de escrever um texto sobre o Natal e o Ano Novo, principalmente para lembrar as pessoas que, nesses tempos de festas e de reuniões familiares, nem sempre nós, os profissionais da segurança pública, podemos desfrutar desse privilégio.

No fim de ano, é quando surgem escalas de serviço extra, e os efetivos precisam ser ampliados para dar conta do aumento de ocorrências decorrentes das festividades. É nesse momento que os policiais mais novos enfrentam seu primeiro impacto na profissão: estar longe da família em momentos importantes.

É verdade que não é apenas nessas datas que os policiais são privados do convívio familiar, mas, sem dúvidas, esta é uma das épocas mais dolorosas para estar escalado em um policiamento.

Nos últimos anos, tenho observado um fenômeno, no mínimo, interessante: a glamorização das carreiras policiais. As redes sociais estão povoadas de perfis e páginas onde jovens policiais aparecem em fotos ostentando seus uniformes, quase sempre com produção ou uso de filtros para tornar os registros mais atrativos.

As páginas de mentores e cursos preparatórios criam a ilusão de que a carreira policial proporciona uma vida de conforto, quase de luxo. Exaltam a estabilidade do serviço público e a oportunidade de uma carreira gloriosa. O candidato desavisado acaba acreditando que, ao ingressar na carreira policial, estará entrando em mais uma vertente do funcionalismo público — uma ilusão que precisa ser desfeita.

A verdade é que a carreira é dura. Os policiais, principalmente os militares, não têm uma série de direitos que os civis consideram básicos. Por exemplo, não podem fazer greve, participar de sindicatos ou integrar partidos políticos. Mesmo sua liberdade de expressão não pode ser exercida de forma plena, e coisas comuns, como criticar um chefe, podem ser consideradas crimes militares dentro da caserna.

As jornadas de trabalho também não estão submetidas às regras aplicadas aos civis. Apesar das escalas ordinárias, os policiais militares podem ser convocados em seus horários de folga, muitas vezes sem nenhuma compensação. A qualquer momento, o policial pode ser acionado e, independentemente dos compromissos pessoais que tenha assumido, está obrigado a se apresentar, sob pena de punição administrativa ou, em alguns casos, até mesmo pena.

Os turnos de serviço podem durar bem mais do que previsto nas escalas, um exemplo cotidiano é quando o policial precisa acompanhar a lavratura de um auto de prisão em flagrante, onde os procedimentos podem se estender por horas, mesmo após o término do serviço. Além disso, quando o caso for a julgamento, o policial será convocado para depor o que nem sempre é computado como hora trabalhada e muitas vezes a audiência é marcada no horário de folga do policial.

Mas talvez o elemento mais perturbador da profissão seja a lida diária com a violência e a criminalidade. O policial não é um funcionário público comum que lida com burocracias, processos e protocolos frios. Cada turno de serviço é um encontro com o que há de pior na sociedade: assassinatos, estupros, violência doméstica, pessoas destruídas pelas drogas e vítimas desesperadas fazem parte da rotina.

Cada profissional lida com esse universo de uma forma diferente, mas o que é comum a todos é que essa realidade acaba impactando o modo de pensar e encarar a vida, podendo trazer sérios problemas de relacionamento com as famílias, que geralmente não compartilham dessas experiências e não conseguem entender as dores e angústias dos profissionais de segurança pública.

Por isso, não é raro que os policiais enfrentem problemas de natureza familiar, que acabam gerando divórcios, dificuldades nos relacionamentos com os filhos e o afastamento do policial do convívio comum, muitas vezes de forma involuntária e não intencional. Esses casos se agravam quando o policial não se adapta ao trabalho, principalmente porque suas expectativas em relação ao cotidiano da profissão não foram correspondidas.

Muito dessa frustração é fruto das expectativas geradas por influenciadores, mentores e cursos preparatórios, que criam a imagem de uma polícia ideal, inexistente, como forma de vender seus produtos ou aumentar o engajamento nas redes sociais.

A rotina policial pode afetar os profissionais de forma ainda mais destrutiva caso o policial não consiga processar as situações vividas e o estresse resultante. A válvula de escape, nesses casos, pode ser o álcool, as drogas ou comportamentos autodestrutivos.

Por isso, temos acompanhado um crescimento acelerado no número de suicídios entre policiais, em todas as forças. Essa situação vai além dos cuidados com a saúde mental, pois expande para questões existenciais e exige das corporações um olhar amplo e holístico, que não deixe de lado os aspectos sociais e espirituais que podem ajudar a diminuir essa mazela.

Em uma sociedade materialista e profundamente ateia e antirreligiosa, defender essas estratégias para ajudar os policiais soa como uma blasfêmia, algo de gente atrasada. No entanto, sempre se soube da importância dessa assistência para os policiais. Por isso, todas as corporações militares possuem um serviço de capelania para prover conforto e assistência espiritual aos seus membros.

Contudo, o preconceito contra a religião, de forma geral, e especialmente contra o cristianismo, tem provocado o sucateamento desse serviço, que acaba sendo relegado a funções como funerais, formaturas e visitas a doentes. Ou seja, uma ferramenta que poderia estar sendo usada de forma efetiva para salvar vidas é relegada a segundo plano pela aversão moderna a qualquer coisa que não venha da academia, da imprensa ou de intelectuais, mesmo que essas técnicas tenham se mostrado insuficientes para atender à demanda das pessoas.

O reconhecimento social é outro elemento que pode gerar insatisfação entre os policiais. Mesmo conscientes da importância e complexidade de seu trabalho, os profissionais acompanham diariamente a mídia, ONGs, entidades de direitos humanos, trabalhos acadêmicos e uma variedade de intelectuais orgânicos e forças políticas categorizando suas corporações como forças violentas e opressivas, dedicadas ao genocídio das populações pobres e negras, entre outras acusações infundadas.

Essas narrativas, embora possam não afetar diretamente os profissionais da segurança pública, acabam encontrando ressonância entre seus familiares e amigos, gerando questionamentos constantes e a desconfiança das pessoas mais importantes no círculo social dos policiais.

Mesmo com todas essas adversidades e problemas, os concursos para as carreiras policiais estão cada vez mais concorridos. Muitos candidatos desconhecem essa realidade e entram na profissão sem ter noção do tamanho do desafio que vão enfrentar.

Para a maioria dos policiais, o maior perigo não é enfrentar criminosos ou o risco diário de vida — isso já fazia parte do contrato. O risco real é ter sua vida e carreira destruídas pela mesma sociedade que juraram proteger.

Neste Natal, quero deixar este presente para os futuros policiais, não para desestimulá-los a ingressar na carreira, mas como um choque de realidade, para que adotem esse estilo de vida de forma consciente, sabendo que essa escolha significa muito mais do que apenas optar por uma profissão. Essa carreira impactará a vida dos futuros profissionais de muitas formas, e a maioria delas sequer foi mencionada aqui. Trata-se de um verdadeiro sacerdócio.

O Natal é o momento de lembrarmos do maior sacrifício já feito pelo próximo. Nesta data, Deus se tornou homem para se sacrificar por aqueles que o rejeitaram. Que o sacrifício de Cristo na cruz possa ser a inspiração para aqueles que decidiram se tornar policiais. Assim como Ele, seremos rejeitados por aqueles que queremos proteger, nossa dor será ignorada, e muitos irão se aproveitar de nossos piores momentos para nos julgar e condenar.

Por isso, esta não é uma missão comum. Ela exige de seus comissionados muito mais do que a busca por um emprego, requer a vocação para um chamado maior do que nós mesmos: servir e proteger.

“Ninguém tem maior amor do que este: de dar alguém a própria vida em favor dos seus amigos.” — João 15:13